domingo, 5 de junho de 2016

Cartas de Hamburgo I

nada aqui falta excepto um encordoamento
de afinidades
a casa leva o seu tempo
ergue-se da secura de lágrimas
um lago de sal vertido
enche-se de empréstimos
doações objectos indesejados e a barca
que nela aporta sobe e desce o canal
sôb bátega vento ou tímida estrela
atravessou já países em cada a desilusão
se plantou no casco fungo em árvore
alastrando as suas fibrilas até estrangular
com paciência a via da vida

voga e vai vazia nas vagas
nenhuma amarra a sustém
caronte não pesa nas suas tábuas
ficou na margem guiando barcos de papel em poças
em cada inscreve um nome que se dilui
amigo pai mãe irmão irmã mortos
nomes como deus ar no oco do corpo
ou batida da língua nos dentes com sopro sibilado
tanto a carregar no porão e vai cheio de nada
e o poema que se escreve é uma onda que recorda
as falsas despedidas prolongando as declarações
com a duração do momento
fósforo para a noite da esperança

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